Em 28 de abril de 1967, uma decisão polêmica encerrou, momentaneamente, sua carreira no boxe. Entretanto, por conta disso, Ali se tornou uma referencia ainda maior para a sociedade negra americana

Fabio Previdelli

“Fui o Elvis do boxe, o Tarzan do boxe, o Super-Homem do boxe, o grande mito do boxe”, foi por essa e outras frases marcantes que Muhammad Ali se tornou um dos maiores esportistas americanos não só dentro do ringue como fora dele.

Considerado o maior pugilista da história, tem um histórico de 29 lutas vencidas, além dos cinturões do Conselho Mundial do Boxe e da Associação Mundial do Box. Porém, sua trajetória gloriosa dentro do esporte quase foi apagada por algo que ocorreu fora dele: a Guerra do Vietnã.

Em 28 de abril de 1967, The Greatest, como era conhecido, se recusou a entrar no Exército dos Estados Unidos e a participar do conflito. Por um momento, chegou até se apresentar a uma unidade do Exército em Houston, no Texas, mas se recusou três vezes em dar um passo à frente quando ouviu seu nome ser chamado pelos oficiais.

Muhammad Ali em ação em 6 de agosto de 1966 / Crédito: Wikimedia Commons

 

Além de relatar que não participaria do conflito por questões religiosas — nesta fase de sua vida já estava convertido ao islamismo e abandonado seu nome de batismo, Cassius Clay —e políticas, soltou outra de suas frases marcantes: “Por que eles deveriam me pedir para colocar um uniforme, ir a dez mil milhas de casa e atirar bombas e balas nas pessoas marrons no Vietnã enquanto as pessoas chamadas de ‘nigger’ em Louisville são tratadas como cachorros e negadas de direitos humanos básicos”.

Como consequência, teve sua licença de boxeador cassada e, em junho daquele ano, em um julgamento que durou apenas 21 minutos de deliberação, foi considerado culpado por se recusar a servir seu país na Guerra. Assim, teve todos seus cinturões de campeão mundial retirados e poderia pegar ate cinco anos de prisão.

Muhammed Ali sendo fotografado por Malcolm X / Crédito: Wikimedia Commons

 

Ali serviu como bode expiatório do governo para mostrar a todos o que o Estado não perdoaria quem se rebelasse contra a Guerra. Independente de quem fosse, todos iriam pagar. Mas esse duro golpe não seria capaz de nocauteá-lo, não Muhammad Ali.

Assim, o pugilista ganhava outro título, talvez o mais importante de sua carreira: o de ser responsável por defender os negros, pobre e muçulmanos que lutavam contra o sistema. O boxeador passou a fazer discursos em escolas, rádios e rede de televisão, explanando não só o que acreditava ser errado naquela Guerra, mas colocando o dedo na ferida de todos os problemas da sociedade americana. Foi nesse cenário de luta em favor da igualdade que Ali se tornou um enorme representante.

Seu mito se tornou ainda maior depois que ele foi capa da revista Esquire, em abril de 1968, sendo relatado com um mártir. “E quem é um mártir? São Sebastião é um mártir”, disse Carl Fischer, fotógrafo da revista.

A referência ao santo parecia clara. De acordo com sua lenda, São Sebastião se alistou no Império Romano, mas, por ser cristão, se recusou a matar outros cristãos, sendo benevolente com o inimigo. Assim, foi condenado à morte por flechadas pelo Imperador Diocleciano. Sobrevivente, o santo se se curou e decidiu enfrentar seu algoz, mas dessa segunda vez acabou não resistindo.

Era assim que Ali era visto, não como um santo, mas idolatrado por ser um negro que não se calou mesmo sendo condenado à morte pública. Continuando expondo seus ideiais mesmo após ter o corpo cheio de flechas.

Capa da revista Equire com Muhammad Ali / Crédito: Divulgação Esquire

 

“Eu lembro que os professores do meu colegial não gostavam de Ali, porque ele era tão anti-establishment, e ele meio que tampava o nariz para as autoridades. O fato que ele se orgulhava por ser um homem negro e tinha tanto talento fez algumas pessoas pensarem que ele era perigoso. Mas, por essas várias razões, eu gostava dele”, declarou Kareem Abdul-Jabbar, uma das maiores lendas da NBA, em uma entrevista.

Em 1971, a Corte Suprema dos Estados Unidos sentenciou, por 8 votos a 0, que a setença imposta a Ali fosse retirada, apesar dele já ter retornado aos ringues um ano antes. Mesmo tendo perdido seu auge no boxe — Ali ficou parado dos 25 aos 28 anos —, ele ainda retornou a tempo de conquistar novamente o cinturão mundial dos pesos pesados.

Muhammad Ali-Haj faleceu em 3 de junho de 2016, aos 74 anos, devido a complicações respiratórias. Importante ressaltar que o pugilista já lutava há 32 anos contra o mal de Parkinson, que provavelmente lhe foi causado pelo esporte que tanto defendeu.

 

Fonte: Aventuras na História.

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