Posicionamento da Coalizão Negra por Direitos sobre a Comissão de Juristas da Câmara Federal destinada ao aperfeiçoamento da legislação de combate ao racismo.
Brasília, 20 de janeiro de 2021
Ao Presidente da Câmara dos Deputados
Sr. Rodrigo Maia
Ref. Ato do Presidente de 17/12/2020 que cria a Comissão de Juristas destinada a
avaliar e propor estratégias normativas com vistas ao aperfeiçoamento da
legislação de combate ao racismo estrutural e institucional no país.
A COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS, articulação nacional que reúne mais de 170
organizações, coletivos e entidades históricas do movimento negro para promoção de
ações conjuntas de incidência política nacional e internacional em defesa do nosso
legado de resistência, luta, produção de saberes e de vida. Regida pelos princípios de
lutar pela construção de um país mais justo e combater o racismo, discriminação racial
e a política de genocídio da população negra no Brasil e no mundo, tem atuado de
forma incisiva neste Congresso Nacional na defesa da vida e direitos das pessoas
negras, bem como pela representação equânime na política institucional.
Em 17 de dezembro de 2020, com surpresa, os movimentos negros
receberam a notícia desta Câmara de Deputados estabelecendo uma Comissão de
Juristas destinada a avaliar e propor estratégias normativas de aperfeiçoamento da
legislação de combate ao racismo estrutural e institucional no país.
Em nenhum momento os movimentos negros foram consultados ou ouvidos
para o processo de construção dessa Comissão, estabelecida em um momento de
grande fragilidade institucional para o campo de defesa e proteção de direitos, uma vez
que temos observado um desmonte sistêmico de políticas para efetivação dos direitos
humanos e enfrentamento ao racismo e discriminação racial.
A abertura de um processo de revisão de legislação sobre racismo deveria
minimamente considerar aqueles que foram fundamentais para que essas legislações
hoje existam: o movimento negro. Não há política institucional de enfretamento ao
racismo que tenha sido estabelecida sem a luta do movimento negro, sem a articulação
do movimento atuando efetivamente para que as nossas vozes e argumentos fossem
considerados e nossos direitos também respeitados.
Há, portanto, na origem desta Comissão um vício irreparável que coloca em
xeque a sua legitimidade. Qualquer debate legislativo há de respeitar a sociedade civil
organizada ao entorno da temática e a luta histórica dos movimentos negros foram
responsáveis pelas parcas leis antirracistas existentes. Assim sendo, faz-se
fundamental revisar a forma de produção legislativa desta casa, para que seja
construído conjuntamente à movimentos negros comprometidos com a luta antirracista
e com a defesa dos direitos humanos e da democracia.
Reconhecemos o currículo acadêmico e profissional dos juristas indicados para
serem parte desta Comissão, porém, as políticas públicas e legislações que se propõe
a combater o racismo estrutural da sociedade brasileira necessitam da
interseccionalidade e da pluralidade de olhares de diversos campos para além do
Direito, além de uma constituição que reúna o mais amplo arco de evidências no
tocante ao diálogo com as organizações do movimento negro e seu ativismo contra o
racismo.
Atenciosamente,
COALIZÃO NEGRA POR DIREITOS