Margaret Mead: uma antropóloga à frente do seu tempo e fundamental para os estudos de gênero atuais.

Por Vitor Paiva

A importância do trabalho da antropóloga estadunidense Margaret Mead hoje se revela determinante sobre os mais importantes debates atuais, bem como as próprias bases de pensamento sobre temas como gênero, cultura, sexualidade, desigualdade e preconceito. Nascida em 1901 e tendo ingressado no Departamento de Antropologia da Universidade de Columbia e lecionado em diversas universidades dos EUA, Mead se tornou a mais importante antropóloga de seu país e uma das mais importantes do século XX por diversas contribuições, mas principalmente ao demonstrar que as diferenças de comportamento e trajetória entre homens e mulheres, bem como entre diferentes gêneros em diferentes povos, se dava não por elementos biológicos ou inatos, mas sim pela influência e o aprendizado sociocultural.

Não é por acaso, portanto, que o trabalho de Mead é considerado uma das pedras fundamentais para o movimento feminista e de libertação sexual modernos. Após realizar estudo sobre as diferenças entre os dilemas e comportamentos de adolescentes de Samoa em meados dos anos 1920, especialmente comparados aos jovens dos EUA de então – publicado em 1928, o livro Adolescência, Sexo e Cultura em Samoa, já mostrava a influência sociocultural como elemento determinante do comportamento de tal grupo –, foi com a pesquisa realizada entre homens e mulheres de três diferentes tribos de Papua-Nova Guiné que a antropóloga realizaria um de seus mais influentes trabalhos.

Publicado em 1935, Sexo e Temperamento em Três Sociedades Primitivas apresentava as diferenças entre os povos Arapesh, Tchambuli e Mundugumor, revelando uma vasta gama de contrastes, singularidades e diferenças entre as práticas sociais e mesmo políticas dos sexos (o conceito de ‘gênero’ ainda não existia na época) que evidenciavam o papel cultural como determinantes. A começar pelo povo Tchambuli, liderado por mulheres sem que isso, conforme a obra apresenta, trouxesse distúrbios sociais. No mesmo sentido, o povo Arapesh se revelava pacífico entre homens e mulheres, enquanto os dois sexos entre o povo Mundugumor se revelavam ferozes e beligerantes – e entre os Tchambuli todos os papeis então esperados se invertiam: homens se enfeitavam e demonstravam suposta sensibilidade e mesmo fragilidade, enquanto as mulheres trabalhavam e demonstravam funções práticas e efetivas para a sociedade.

As formulações de Mead, portanto, colocavam em xeque todas as noções então imperativas sobre as diferenças de sexo, questionando por completo a ideia de que as mulheres seriam naturalmente frágeis, sensíveis e dadas aos trabalhos domésticos, por exemplo. De acordo com seu trabalho, tais noções eram construções culturais, determinadas por tais aprendizados e imposições: assim, as pesquisas de Mead se tornaram instrumento para a crítica a diversos estereótipos e preconceitos sobre a mulher e, assim, para o desenvolvimento moderno do feminismo. Mas não somente: em uma aplicação expandida, seus apontamentos valeram para as mais variadas noções preconceituosas a respeito de todo e qualquer papel social imposto sobre um determinado grupo.

O trabalho de Mead foi sempre alvo de críticas profundas, tanto por seus métodos, quanto pelas conclusões apontadas, mas sua influência e importância só aumentou ao longo das décadas. Até o fim de sua vida, em 1978 e aos 76 anos, a antropóloga se dedicou a temas como educação, sexualidade e direitos da mulher, para combater estruturas e metodologias de análises que propagassem meros preconceitos e violências travestidas de conhecimento científico – e que não reconhecessem o papel central das influências e imposições culturais sobre as mais variadas noções: sobre nossos preconceitos.

 

Fonte: Hypness.

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