Quando perguntados sobre personalidades do movimento negro em sala de aula, estudantes lembram de Martin Luther King, Malcolm X ou Panteras Negras. As referências para pensar o antirracismo são sempre as vindas dos Estados Unidos, como se não houvesse movimento negro com força no Brasil. O diagnóstico feito por Jéssika R. S. Silva, professora de História da rede estadual do Rio de Janeiro e doutora em Educação pela UFRJ, aponta para uma lacuna de toda a comunidade escolar.

O que muitos alunos, mães e pais não sabem é que o movimento negro no Brasil, a exemplo da Frente Negra Brasileira (FNB), maior organização política do tipo na primeira metade do século 20, foi fonte de inspiração para a luta dos negros americanos. Nessa mesma linha, a Lei 10.639, de 2003, que tornou obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira, foi uma conquista do movimento negro deste país. Algo que o movimento negro nos Estados Unidos nunca conseguiu alcançar.

Angela Davis, intelectual ativista americana de longa trajetória, já afirmou em diversos momentos o quanto ela aprende com as pautas e ações organizadas pelo movimento negro daqui. Em sua avaliação, Lélia Gonzalez (1935-1994), pensadora negra feminista brasileira, lhe ensinou muito mais do que ela teria a nos ensinar.

Embora ainda não reconheçamos amplamente as organizações e as lideranças do movimento negro brasileiro — por nome e sobrenome — nas escolas e na sociedade como um todo, temos lidado com os resultados de suas ações. A lei citada e as políticas de cotas para negros e negras nas universidades e serviços públicos são fortes expressões dessa agência histórica.

Como essas conquistas foram possíveis? As respostas demandam o nosso conhecimento das diversas trajetórias de luta da população negra brasileira, porque elas dão a medida do que nós somos como Nação, porque são parte incontornável da História do Brasil. As crianças e jovens nas escolas, negras em sua maioria, precisam saber que a luta antirracista aqui produziu lideranças e organizações negras como Lélia Gonzalez, Abdias Nascimento (1914-2011), Oliveira Silveira (1941-2009), Carlos de Assumpção (1927-), Lydia Garcia (1938-), Ana Célia da Silva (1940-), Edson Cardoso (1949-), Sueli Carneiro (1950-), Zélia Amador (1951-), a FNB, o Movimento Negro Unificado (MNU), entre tantos outros sujeitos individuais e coletivos que têm ajudado a mudar o Brasil por meio da luta antirracista.

A Rede de HistoriadorXs NegrXs tem se somado a esses esforços em suas ações internas e externas para aquilo que o MNU já reivindicava em sua Carta de Princípios de 1978: “a reavaliação do papel do negro na História do Brasil”. Isso significa que as vidas negras precisam ocupar os currículos, as escolas e qualquer espaço na proporção de sua real relevância! Estamos atuando para efetivamente fazer valer a máxima: Vidas Negras Importam!

 

Amilcar Pereira, doutor em História (UFF) e professor da Pós-Graduação em Educação e em Ensino de História (UFRJ)
Stephane Ramos, doutoranda em História (UnB) e mestre em História Comparada (UFRJ)

Fonte: O Globo | Foto: André Melo

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