Sangue yanomami corre pelos garimpos ilegais.

Por Evilene Paixão e Marina Terra

Relatório com imagens aéreas mostra avanço rápido e destruidor do garimpo ilegal no território indígena. Levantamento feito pela Hutukara Associação Yanomami nomeou resultado da exploração ilegal na área indígena como a nova “Serra Pelada”, conhecido como maior garimpo a céu aberto do mundo, localizado no Sudeste do Pará. O garimpo ilegal na Terra Yanomami, localizada na região Norte de Roraima, degradou cerca de 200 hectares de floresta – o equivalente a 200 campos de futebol – somente no primeiro trimestre deste ano. Ao total, imagens de satélite indicam cerca de 2.430 hectares destruídos. A estimativa é que mais de 20 mil garimpeiros atuam infiltrados na Terra Yanomami.

Sobrevoos realizados em 7 e 9 de abril de 2021 revelaram que o garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami, nos estados de Roraima e Amazonas, produziu uma nova ‘Serra Pelada’ — nome do maior garimpo de ouro a céu aberto do mundo, no sudeste do Pará. Assim como na corrida do ouro dos anos 1980, a crise econômica e o preço do metal estimulam os garimpeiros à atividade, que hoje promove o desmatamento, a contaminação dos rios por mercúrio, a violência contra comunidades e, também, a disseminação da Covid-19 no território indígena.

A violência contra as comunidades indígenas, inclusive, registra uma escalada crescente ao longo deste mês de maio. Desde o dia 10, garimpeiros ilegais estão atacando a tiros comunidade de Palimiú, após indígenas instalarem uma barreira sanitária e impedirem que usassem o rio Uraricoera para chegar a um de seus acampamentos. Em retaliação, os bandidos realizaram uma série de ataques com armas pesadas, como fuzis e metralhadoras, e até bombas de gás lacrimogêneo. Como resultado do primeiro ataque, duas crianças Yanomami morreram afogadas em meio ao pânico.

As recentes imagens aéreas da destruição, parte central do novo relatório publicado pela Hutukara Associação Yanomami e encaminhado às autoridades, comprovam o avanço desenfreado dos invasores. “As cenas observadas no [rio] Uraricoera, ao rememorar Serra Pelada, alertam para a imensa tragédia ambiental e humana que o garimpo na TI Yanomami tem se tornado. Não foi por falta de aviso, porém, que a situação atingiu tal gravidade”, afirma o relatório.

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Atualmente, mais de 20 mil garimpeiros estão na terra Yanomami. Decisão de março deste ano da 2ª Vara da Justiça Federal de Roraima, atendendo a pedido do Ministério Público Federal, exigiu que a União apresentasse um cronograma para a retirada dos invasores, sob pena de multa. Em julho de 2020, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região já havia concedido uma liminar determinando que a União tomasse medidas emergenciais para proteger a Terra Indígena Yanomami da invasão garimpeira e assegurar a saúde e vida dos povos Yanomami e Ye’kwana. Após quase um ano, no entanto, a decisão judicial ainda não foi executada.


Canteiro de garimpo próximo à Serra da Estrutura, região onde vivem os indígenas isolados Moxihatëtëa

“Não se trata de um problema sem solução. O Estado possui todas as condições para fazer valer a lei e promover a neutralização dos crimes praticados pelo garimpo contra os indígenas da TI Yanomami e o restante da sociedade brasileira”, afirma o documento. “A experiência do passado prova que isso é possível, por meio de ações estratégicas. Acelerar o tempo de resposta a este desafio, a partir de um plano de ação estratégico e coordenado, é também uma forma de preservar recursos da União e valorizar seu patrimônio”.

Em março de 2021, análises de imagens de satélite indicaram um total acumulado de 2.430 hectares destruídos pelo garimpo na Terra Indígena Yanomami, sendo que no primeiro trimestre deste ano a área destruída cresceu quase 200 hectares. Somente em 2020, 500 hectares de floresta amazônica na Terra Indígena Yanomami foram devastados. Mantido esse ritmo, 2021 deve marcar um novo recorde de destruição.


Garimpo na Terra Yanomami já devastou mais de 700 hectares de floresta de janeiro de 2020 a março de 2021

Conforme revelam as análises dos sobrevoos de abril, os garimpos cresceram sobretudo nas calhas dos rios Mucajaí e Catrimani, nas regiões de Kayanau, Homoxi e Alto Catrimani. Antes, as grandes áreas impactadas se concentravam no rio Uraricoera. “Tal fenômeno (…) é um importante indicador do desenvolvimento das estruturas de apoio [logística e de serviços] nessas zonas, e deveria servir de alerta para os riscos da consolidação de novas ‘cidades’ do garimpo na TIY”, sublinha o relatório.

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Próximo à foz do rio Parima, no rio Uraricoera, há uma das maiores concentrações de garimpeiros já vistas, em cenas que lembram as de Serra Pelada, há 40 anos. Impressiona a magnitude do impacto, a profundidade das crateras e a complexidade da estrutura de apoio à atividade, com a existência de barracões especializados. Em um deles há um “restaurante”, com mesinhas redondas dispostas ao longo da margem do rio.


Restaurante que atende garimpeiros no rio Uraricoera, Terra Yanomami

A concentração de garimpeiros na região próxima à foz do Parima é relativamente recente, afirma o documento, “tendo se expandido e consolidado nos últimos anos”. Segundo a Hutukara, as imagens “atestam o vigor desse núcleo garimpeiro e reforçam a ideia de que a formação das novas áreas se deu muito mais em caráter de expansão do que de substituição”, já que não se observou uma diminuição da exploração na ferradura do rio Uraricoera em Waikás, no local conhecido como “tatuzão do Mutum”. Em junho de 2020, dois indígenas yanomami foram assassinados por garimpeiros na região do Parima.

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Segundo a organização indígena, as informações do relatório demonstram que as operações pontuais realizadas nos últimos meses não são suficientes para controlar o aumento vertiginoso da invasão. “Elas atenuam o impacto do garimpo em certas zonas, mas temporariamente e de forma não consistente”, ressalta.

“Para que a invasão seja de fato controlada, é preciso que as operações sejam mais abrangentes e eficientes na destruição da estrutura de apoio à atividade ilegal [explosão de pistas e destruição de currutelas], bem como na inutilização do maquinário utilizado [motores, balsas, aeronaves e helicópteros, quadriciclos, etc], para que os financiadores da atividade sejam descapitalizados e não possam reinvestir tão facilmente na retomada da invasão”, reforça a Hutukara.

 

Fonte: Instituto Socioambiental – ISA.

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